Silêncio Branco


 
 
Silêncio Branco
Toronto, fevereiro 2014
            Silêncio. O silêncio é branco. Sempre pensei que fosse escuro, gris, mas é branco.
A natureza silencia quando o branco chega. Dorme, serena.  Os pássaros não cantam, as flores adormecem em suas sementes, as árvores secam sem folhas nem frutos.   
      Imobilidade. Somente o sol vem e vai, em pequenos espaços de tempo: espia, ilumina e sai. Foge do frio. O vento sopra gelado, lufadas em desabafos contidos. Movimenta por algum tempo a rigidez da natureza adormecida em lençóis muito alvos.
            O sono gelado tem sonhos de calor, de flores e frutos maduros; de sons intensos que virão com o despertar.
            Os homens se encolhem, se aconchegam nos lares, ao redor do fogo, dos chás, e das bebidas fortes. Assistem a cortina branca descer a cada dia pela vidraça. A cada despertar, a esperança de uma semente brotando, do gorjeio de um pássaro.
            As portas das casas – fechadas; as cadeiras repousam atrás das portas – fechadas; aguardam o bom tempo para se abrirem em sorrisos nas varandas. As janelas suadas aguardam o calor para mostrar suas cortinas coloridas.
            Os carros se movem lentos, cautelosos, silenciosos. Não buzinam, não rangem os pneus. Sob a aparente candura do branco pode ser encontrada a mancha vermelha, o óleo derramado. É o período em que a realidade está encoberta, a armadilha disfarçada em paz; a guerra recolhida na trincheira, mas pronta para atacar.
            Disfarce, lindo disfarce. Em silêncio trama revolução; revolução de vida.
            No momento em que o lençol alvo é recolhido, em manchas lamacentas, as primeiras manifestações de vida contida acontecem. Muito aos poucos, a natureza se acorda do grande sono. A princípio preguiçosa. As aves aguardam impacientes para deixar seus ninhos; os animais farejam a vida que retorna.
            A porta se abre, o sol entra. A janela grita com abas abertas: a primavera está chegando!


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