A Caixa de Pandora


A Caixa de Pandora ou Elogio à Curiosidade

            Nós, mulheres, constantemente somos acusadas de curiosas. Não poderia ser diferente já que, temos contra nós, alguns exemplos que nos deixam sem defesa – ou quase.
            Primeiro, conta a Bíblia, que a mulher de Lot  olhou para trás e virou estátua de sal. Ela apenas queria ver o espetáculo que acontecia no momento da destruição de Sodoma e Gomorra! Proibida pelo anjo, sob pena de castigo, ela não poderia se voltar e espiar... Seguia, assim, submissa, rumo às montanhas.  Porém, algo muito forte a fez virar rosto - não pensou, nem temeu: ousou e cristalizou. Estaria ela olhando pela última vez o lugar do pecado, da perdição? Teria lembranças? Ou simplesmente a beleza da chuva de pedras e enxofre a atraía? Não se sabe. Só restou a idéia da desobediência – e do castigo.
            Bem antes, Pandora que abrira a caixa proibida. Uma simples caixa, o que teria de tão especial? Correu o risco da penalidade e soltou as misérias do mundo. Assustada com o resultado de seu feito, rapidamente fechou a tampa, deixando guardada, apenas a Esperança, segundo reza a lenda. Por isto, talvez, as mulheres estejam sempre imbuídas de um sonho a realizar, um alvo a atingir, mesmo frente a infortúnios.
            Nos contos medievais, como na história do Barba Azul, a jovem princesa espera a viagem de seu Senhor para abrir a única porta do castelo a qual lhe era proibida a entrada. Com a chave no bolso, não resiste à curiosidade e descobre o segredo de seu amo: o esconderijo dos corpos das esposas curiosas. Seu destino só não foi trágico, como o das outras donzelas, pela sua astúcia. Mais uma vez a curiosidade é castigada.

            Como ser mulher num contexto onde a inconformidade, o desejo do saber, e acima de tudo, a quebra dos limites ― pontos marcantes de nosso gênero, resultam sempre em castigo?
            Seria a curiosidade um mal tão grande e necessariamente portador de desgraça?
            E Eva, a primeira curiosa infratora, seria ela responsável por nos deixar a pesada culpa de ter ouvido aos apelos da serpente? Se não houvesse sucumbido à curiosidade de experimentar do novo fruto, com certeza não teríamos acesso à Árvore do Conhecimento.
            Penso ser esta nossa maior qualidade, até mesmo, uma virtude, que nos coloca sempre em busca de algo novo, diferente, que transforme e quebre paradigmas de todos os tipos. Aceitando dogmas, normas e leis, estamos sempre colocando um empecilho na procura de razões, porquês, e das origens dos fatos.
           
            Quero sim ser estátua de sal, ser Pandora, e a princesa do Barba Azul. Quero ser a Eva que não acha graça num Paraíso tedioso, onde tudo funcione sem crise, sem caos, sem gosto. Quero ser a Eva infratora, a que pecou e foi agraciada pela descoberta do prazer.
            Mesmo que soframos as misérias do mundo, nós, mulheres curiosas, somos o sal da Terra.

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